Os grupos Folha e O Globo publicaram nesta segunda-feira (25/05) que abandonaram a cobertura diária do Palácio da Alvorada por falta de segurança. A decisão foi encaminhada ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e é válida até que o Palácio do Planalto garanta condições seguras para os jornalistas trabalharem.
“Falta de Segurança”, acredita? Eu poderia supor uma série de motivos, mas nunca em sã consciência democrática que um bando de seguidores do presidente, e o próprio presidente da República, fossem capazes disso.
Mas para aqueles que acharam uma boa notícia, não há porque bater no peito e dizer “vencemos”.
Quando a imprensa deixa a cobertura diária de um dos seus principais atores, morre a democracia. Morre a liberdade de expressão e o cuidado mais refinado com a informação. Informação, aliás, que quando sai o serviço profissional de Jornalismo, fica nas mãos de quem quer que seja, inclusive manipuladores, raivosos, fascistas e criadores do caos como já se mostrou ser boa parte daqueles que publicam discursos de ódio contra a imprensa e outros setores da sociedade.
Comemorar esta desistência do jornalismo profissional em cobrir a presidência no Alvorada é comemorar uma derrota imensa da liberdade e de um de seus pilares. Nos manuais de atuação dos ditadores e fascistas, a ausência da imprensa é considerada fundamental para que somente o discurso próprio, que encobre mazelas e corrupções nos mais diversos níveis, seja o único oferecido. E é ofertado, aliás, coberto de muito doce, muita calda, para esconder a verdade que tenta sobreviver lá no fundo.
O recado destes grupos de imprensa é claro: “Se não acreditam na imprensa profissional, que fiquem com a versão oficiosa do gabinete do ódio, dos tios e tias do WhatsApp, dos inescrupulosos e daqueles que não suportam a democracia”. Que degustem as mandiocas podres que receberão.
Aos que são sensatos e conseguem superar o discurso de ódio contra a imprensa, por serem justamente conscientes, a informação continuará chegando pelas vias oportunas e também coerentes. Só se considera refém da imprensa ou de instituição que seja aqueles que não possuem conhecimento e pensamento crítico-reflexivo. Se possuem, sabem onde podem conseguir informação de qualidade. Além de jornalista, sou um cidadão consciente e não é qualquer veículo de comunicação de massa que me passa a perna. Sei avaliar e me orgulho desta educação que recebi em escolas e em casa.
Já passou da hora da imprensa exigir um tratamento mais digno do que este oferecido pela presidência da República. Um cercadinho ao lado de fanáticos é um acinte, um tapa na cara e uma demonstração do quanto este próprio governo não considera a liberdade de expressão como algo sério.
Aliás, há pouco mais de um ano e meio que está claro o fato de que liberdade de expressão para governo e fanáticos seguidores não é o que interessa a eles. Verdade somente a do lado deles e nunca poderá haver um contraditório porque este significará “perseguição”, “lixo”, “cambada de desocupados”, “escória”, “não mostra a realidade”, “comunista”, “marxista”. (Em nota: rogo por um país em que as pessoas saibam o significado do que falam)
Quem não entende de jornalismo, considera mentira tudo que não faz referência exata a sua opinião. Quem age assim possui pouco conhecimento de mundo e deveria ter vergonha de se expor.
A cobertura do Covid-19 tortura os fanáticos e o próprio governo porque a cada dia que se mostram estatísticas de morte e da falta de estrutura de um país tão desigual para lidar com a pandemia, adiciona-se um ponto a mais na página vergonhosa da história de quem decidiu que não iria enfrentar um problema desta envergadura. Porque é isso: ao adotar o negacionismo da doença, o presidente Jair Bolsonaro tenta se eximir de uma culpa que lhe é inata como governante supremo da nação. Não se vê nele uma liderança que procure coordenar uma estratégia que salvará vidas. Pelo contrário, toda semana é uma discussão fora de contexto, é um fato leviano que surge, uma fritura, uma conduta fora dos padrões mundiais. Que pena. O vídeo recente da reunião ministerial prova isso. Se quisesse, seria ele como os grandes líderes mundiais, que crescem nos momentos mais difíceis.
E assim como o governo, restará também um lugar especial na história – devidamente documentado pela imprensa livre, aos seguidores que negam a doença, que buzinam em frente a hospitais, que promovem as aglomerações e enxergam inimigos tão reais como os moinhos de vento de Dom Quixote. Serão sempre lembrados, em texto, áudio, vídeo e imagens.
Porque a imprensa pode desistir de estar em um lugar, mas isso não significa que estará calada. Por experiência própria, a imprensa não morre. Ela apenas desvia daquilo que não interessa e segue seu curso, vazando aqui e ali, até encontrar novamente um caminho seguro para contribuir com o desenvolvimento das democracias.
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